terça-feira, 25 de junho de 2013

São João 1 - as primeiras 12 horas de plantão

Às 05h37 do dia 22 começou meu plantão de festas juninas...

Meu colega do plantão anterior me telefonou informando um chamado para o município de Lagoa da Canoa (141 km de Maceió e 15,7 km de Arapiraca). O atendimento demanda 2h30 de deslocamento (ida e volta) e até 1h para levantamento pericial. O perito retornaria para a base exatamente às 8h, que é o final do plantão.

Itinerário ao local deixado pela equipe anterior (141 km).

Mas, certamente exauridos pelos levantamentos das últimas 24 horas (três para a equipe local, dos quais esse perito que me telefonou não fez nenhum levantamento - dados do sistema eletrônico da secretaria atualizados até dia 25), ocasionalmente uma equipe deixa chamados para a equipe posterior.

Ao chegar na base do IC, já havia chamados para São Sebastião, Igaci, Novo Lino e Flexeiras!

Itinerário ao chamado com prioridade (colisão caminhão x ônibus).

Ressalte-se que só tínhamos dois peritos na base. Somando a chamada pendente, tínhamos cinco locais para atender na primeira meia hora do plantão.

Os cinco primeiros locais do início do plantão.

Utilizando os recursos disponíveis decidi atender aos chamados no Agreste e meu colega de equipe atenderia o Norte. O terceiro colega, quando chegasse na base, atenderia o que aparecesse nas nossas ausências.

PERÍODO DIURNO

Clique na tabela para ampliar.

Observem que tive de priorizar o acidente de trânsito (maior amplitude de danos e dificuldade de administrar o isolamento do local) em detrimento do primeiro chamado para um homicídio. O segundo chamado para outro homicídio ficou em terceiro plano por se tratar de zona rural (em teoria, menor adensamento populacional e consequente facilidade de isolamento do local). A sequência de atendimento também priorizou um itinerário mais otimizado, conforme se vê no mapa acima.

Meu colega teve a sorte de ter os chamados compatíveis em horários e itinerários.

SAÍDA DAS EQUIPES

Saindo do IC e transitando pela rodovia AL-101 Sul.

Rodovia de acesso ao litoral Sul de Alagoas (uma das poucas duplicadas).

LOCAL 01 (10h38) - Colisão ônibus x caminhão em São Sebastião.

Local 01 - várias viaturas atendendo a ocorrência e uma pista de rolamento interrompida.


Apesar da magnitude dos itens envolvidos, felizmente só houve uma vítima.

Fato curioso foi não encontrarmos o disco-diagrama do tacógrafo do ônibus, dentro do ônibus, mas fora da cabine! De qualquer modo o disco continuava dentro do aparelho, apenas que o aparelho ficou pendurado fora do veículo.

Recuperação do disco-diagrama do ônibus.

O tacógrafo é um aparelho que registra a velocidade, deslocamento e funcionamento do veículo monitorado e estes registros ficam gravados no disco-diagrama, como o da foto acima. Existem discos de 24 horas e de sete dias.

Registros do disco-diagrama de tacógrafo (monitoramento de veículo).

O disco do caminhão foi recolhido pelos Policiais Rodoviários Federais e me entregue em mãos. Não é recomendado que a coleta seja feita por terceiros que não o perito que fará o levantamento da ocorrência, mas em se tratando de proteger as provas necessárias ao esclarecimento dos fatos, entendo que qualquer agente público pode fazer a coleta. E no restante, protocolizar toda a cadeia de custódia. Ainda vou verificar a autenticidade dos dados.

Encontrei outro disco no meio das ferragens, mas certamente deve ter sido algum disco antigo que estava na cabine e se alojou no meio dos destroços (foto abaixo).

Disco recolhido no meio dos destroços.

Outros dados serão importantes para explicar o acidente e vestígios no local continuam a ser nossa primeira fonte de informação, principalmente marcas de frenagem e arrastamento de pneumáticos (foto abaixo).

Marcas "desenhando" a dinâmica dos fatos pretéritos.

LOCAL 02 (11h59) - Homicídio em Lagoa da Canoa.

Trajeto até o segundo local sob chuva fina.
A ocorrência se deu numa praça do município, defronte a um templo evangélico e bem próximo à prefeitura.

A importância do isolamento de local.

Isolamentos de locais de crime com uso de fita zebrada tem sua utilidade, mas quando desenvolvidos como simples delimitadores do entorno do cadáver, começam a perder sua valia. Como visto na foto acima, a circulação de curiosos é muito próxima e alguns itens podem ser perdidos.

Como curiosidade, na fase de edição das imagens, comprovei que a aplicação de filtros auxiliam na visualização de alguns elementos, notadamente ampliam o contraste em marcas e manchas, mas no caso presente quase simulei uma "visão de raio X"! Não era necessário, obviamente. Fica como mera curiosidade (fotos abaixo).


Vítima alvejada pelas costas (cinco disparos) o que sugere fuga do agressor e quase certamente implicava numa área de interesse policial muito maior que a promovida pelo isolamento "ao redor do cadáver".



Todos os ferimentos acima são comprovados como de entrada de projétil de arma de fogo (provavelmente calibre 22). Com exceção dos dois disparos na cabeça (imagem 1), os demais foram efetuados através do tecido da camisa e o último (imagem 4) no sentido oblíquo ao plano da pele. A relativa ausência de sangue se deu por causa da chuva antes da chegada da equipe pericial.

Pelas informações dos policiais, o cadáver estava exposto na praça desde as quatro horas da madrugada (cheguei no local às 10h38). Então, não só a rigidez cadavérica já estava instalada como já havia ação de insetos sobre o corpo.

Insetos de alojam no cadáver ainda quente.

Além das lesões esperadas (disparos de arma de fogo) e eventuais lesões da fauna cadavérica (demora no atendimento da ocorrência), temos ainda lesões acidentais. Estas podem resultar da finalização da ação violenta (queda da vítima de sua própria altura contra superfícies vulnerantes, p. ex.) ou ainda de manipulação inadequada no momento dos exames periciais no local ou mesmo nas dependências do IML.


Mesmo esses últimos ferimentos nos oferecem informações a respeito da ocorrência.

No final dos exames, tomadas todas as medidas e fotografias do local, a população não deixa o cadáver sozinho (foto abaixo).

Recolhimento final do cadáver pelo IML.

LOCAL 03 (13h42) - Homicídio em Igaci.

Fomos até a delegacia de Igaci, que não está funcionando em seu endereço original, mas num imóvel descaracterizado. Pelas feições da viatura da Polícia Civil, imaginamos que o acesso não seria tão fácil...


Mas para nossa surpresa, toda a estrada havia sido nivelada e em 20 minutos percorremos os 12,2 km que separavam o município de Igaci para o povoado de Novo Rio.

Trajeto por estrada de barro até o local na zona rural.

O povoado possuía até pavimentação e o local não foi propriamente numa zona rural, mas urbanizada.


Isolamento delimitando o entorno do cadáver.

Infelizmente o isolamento de local ainda pecava por utilizar apenas três pontos de fixação para a fita zebrada (o ideal é começar com quatro pontos mantendo uma distância de pelo menos cinco metros para o último vestígio visível). Considere-se ainda que era um local onde o intervalo de tempo entre a ocorrência e a chegada da perícia já tinha possibilitado muitas intervenções inadvertidas e até inevitáveis na cena do crime (chuva, p. ex.).

A arma utilizada foi branca (instrumento pérfurocortante, faca peixeira, p. ex.). Os ferimentos apresentavam-se característicos, desde pequenas dimensões, grandes e até com evisceração (fotos abaixo).



A equipe do IML teve um pouco mais de espaço para recolher o cadáver. Talvez pelo fato de ser um povoado não havia muitas pessoas presentes.

Recolhimento do cadáver.

Retornamos por outra estrada um pouco menos conservada, mas não foi um trecho longo (7 km percorridos em 13 minutos).


Almoçamos (14h32) em Arapiraca (R$ 35,00 para dois). Chegamos no IC às 16h27. À noite tivemos mais levantamentos...

2 comentários:

  1. muito bom....um aula!!!

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  2. Os gráficos (de isolamento de local de crime) que inseri na última publicação do plantão de São João fizeram parte de uma aula específica para policiais militares. Abraços!

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