segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Ferramentas periciais - Teresina/PI - primeira parte

A exposição no Ministério Público do Piauí teve por título: "Ferramentas periciais aplicadas ao local do crime e ao corpo de delito - o corpo fala".


Falar didaticamente em "ferramentas", exige uma definição preliminar e simples do termo. Ferramenta pode ser entendida como "um dispositivo que forneça uma vantagem mecânica ou mental para facilitar a realização de tarefas diversas". E falar em "realização de tarefas" (com ferramentas) não dispensa o conhecimento da técnica que é: "o procedimento ou o conjunto de procedimentos que tem como objetivo obter um determinado resultado."

A investigação material atual desenvolvida pela perícia criminal exige ferramental específico para atingir seus resultados. Curiosamente, pelas experiências anteriores, neste mesmo curso de capacitação, percebemos que muitos atores do Sistema de Segurança ainda desconhecem a investigação material desenvolvida pelos peritos criminais.

Por isso, antes de esmiuçar o que seriam ferramentas periciais, vale fazer essa introdução a respeito de criminalística.


Em Alagoas a perícia criminal é desenvolvida pela Perícia Oficial por meio de três instituições: Instituto de Criminalística, Instituto Médico Legal e Instituto de Identificação. O primeiro com os peritos criminais, o segundo com os médicos legistas e odontolegistas e o último com os papiloscopistas. Em cada órgão pode existir quadro complementar de auxiliares. Hoje, dezembro de 2012, são 48 peritos criminais, 31 médicos legistas, 5 odontolegistas, 5 papiloscopistas e 15 técnicos de necropsia além de agentes administrativos e policiais civis cedidos para auxiliar nos trabalhos periciais.

Embora nosso imaginário tenha sido povoado pelos inúmeros seriados americanos sobre o tema, podemos, muito sucintamente, afirmar que a criminalística é a disciplina que reconhece e interpreta os sinais do crime. A perícia criminal é o exercício da criminalística desenvolvido pelos órgãos públicos de investigação material e sua fundamentação legal está no artigo 158 do Código de Processo Penal:

"Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado".

Desta forma, tomado conhecimento de uma ação delituosa, se ela deixou vestígios (sinais físicos sensíveis aos sentidos humanos), o exame pericial será indispensável. Se feito diretamente, o perito entra em contato direto e pessoalmente com os sinais. Se feito INdiretamente, então o perito utiliza intermediários para examinar a ação delituosa (fotografias de um acidente, p. ex.).

O corpo de delito pode ser entendido como um objeto unitário (arma, roupa, marca, cadáver etc.) e também como um conjunto de objetos decorrentes do crime (um cômodo repleto de sinais de luta corporal como móveis quebrados, manchas de sangue, armas etc.). Numa concepção ainda mais ampla ele pode abranger até circunstâncias abstratas da ação delituosa como aspectos sociais ou psicológicos, mas neste caso escapa do campo de atuação do perito criminal que só maneja aspectos físicos.

Vale lembrar que na expressão "corpo de delito" o termo "corpo" não se confunde com "cadáver". Um cadáver e uma faca, p. ex., são corpos. Se forem decorrentes de alguma ação delituosa serão ambos considerados corpos de delito e farão parte de uma investigação.

Mesmo desenvolvendo todos os exames possíveis não significa dizer que o perito criminal irá obter todos os esclarecimentos do crime. O trabalho de investigação exige a participação de diversos atores. Na tabela abaixo vemos pelo menos três deles que atuam na fase inquisitorial da persecução criminal. Juízes e promotores possuem funções na fase judicial.

Atuação de alguns segmentos da Segurança Pública.
O quadro acima não mostra, mas faço questão de ressaltar a valiosa contribuição da Polícia Militar. Como uma de suas funções é a de policiamento ostensivo, geralmente, na esmagadora maioria dos casos, são os policiais militares que primeiro abordam uma cena de crime nos logradouros públicos e participam decisivamente da preservação do local de crime.


A criminalística possui alguns objetivos específicos. Didaticamente apresentamos três:

1) estabelecer o fato (comprovar o que houve);
2) estabelecer os meios e os modos (dizer como aconteceu); e,
3) estabelecer a identidade (identificar quem agiu).

Objetivo geral da Criminalística
O objetivo geral da criminalística é fornecer elementos de convicção de ordem técnica e científica ao Judiciário.


Na busca de seus objetivos a criminalística possui seus princípios. Também didaticamente, apresentamos apenas três para compreensão básica de seu funcionamento:

1) princípio da identidade: afirma que dois corpos físicos podem ser indistinguíveis, mas nunca serão idênticos. Com isso podemos "rastrear" os corpos por suas sutis diferenças, ainda que sejam muito semelhantes.

Semelhantes sim, idênticos não.

2) princípio da Troca de Locard: dentre as várias explicações, fiquemos com esta: "quando dois corpos entram em contato, um transfere material para o outro". Ou seja, toda interação física deixa sinais de sua ocorrência. Um impacto de dois veículos sempre promove transferências de material, tintas e sujidades de tal forma que não há como negar a ocorrência do impacto.

Também conhecido como "princípio da transferência".

3) teoria da ligação: a teoria da ligação é uma consequência lógica do princípio da transferência. Ela afirma que o vestígio (ou sinal físico da ação delituosa) gera uma vinculação entre dois corpos. Esta vinculação gera um itinerário: o primeiro corpo atingiu o segundo. Se perseguirmos toda a sequência de vínculos podemos observar o itinerário completo e assim narrar toda a ação, mesmo sem ter presenciado a ação delituosa ou os momentos que antecederam um acidente automobilístico, p. ex.

Esquema ilustrativo da teoria da ligação.
A explicação didática da teoria da ligação induz a imaginarmos que apenas um vestígio tem o condão de unir todos os elementos da cena de crime (vide figura abaixo).

Esquema didático de vinculação.

De fato o vestígio tem a finalidade de vincular elementos, mas é imprescindível asseverarmos que nenhuma cena de crime se reduz a um único vestígio que explique toda a ação delituosa. Todo investigador, seja ele perito criminal ou agente policial, sempre trabalha com um conjunto de elementos vestigiais (vide figura abaixo).

Esquema realístico da teoria da ligação.

Nesta primeira parte da exposição pretendemos fazer uma breve apresentação da criminalística uma vez que muitas pessoas ainda desconhecem o que seja exatamente o trabalho do perito criminal quando se lembram dos seriados americanos ou de figuras heróicas dos filmes policiais.


Na próxima publicação abordaremos as principais ferramentas da perícia criminal.

Observação: quando nos referimos a sermos "didáticos", na verdade simplificamos o conteúdo em sua numerosidade ou profundidade para facilitar a assimilação. O espaço é pequeno e o objetivo não é ser exauriente. Existem outras fontes que podem ser facilmente pesquisadas e oportunamente ofereceremos algumas neste mesmo veículo. Vide este link, p. ex.

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